quarta-feira, maio 09, 2007

Gosto deste livro

E pronto, tardou mais foi: acabei as 816 páginas de O Historiador da Elizabeth Kostova. O blog é que sofreu com isso, mas este é dos livros que não se consegue pousar até chegar ao fim. Será alta literatura? Talvez não, mas está ardilosamente bem escrito. Cada curto capítulo acaba num "cliffhanger", uma situação inesperada e crítica, que leva o leitor a virar a página só para saber o que se passará a seguir. Para tal também contribui a estrutura temporal fragmentada, em multiplos momentos diferentes que se entrelaçam habilmente: a actualidade da narradora, os anos 70 em que se dá o desfecho (provisório) dos eventos, iniciados nos anos 50, antecipados nos anos 30, a Idade Média em que viveu Vlad, o Impalador... O registo epistolar ajuda a compor a trama, dando voz às diversas personagens.
Apesar da temática do vampirismo o classificar na categoria de romance fantástico ou de terror, tem um apelo que transcende largamente este campo. Para mim é sobretudo um romance de académicos e viagens, duas áreas muito próximas das minhas experiências e interesses. Todos os heróis (o os seus adjuvantes) são universitários, já estabelecidos ou imersos nas suas teses de doutoramento, apaixonados pela investigação, à caça da sua presa em bibliotecas e arquivos, viajando entre conferências e sítios do trabalho de campo. Cidades, castelos, mosteiros, aldeias, florestas são minuciosamente descritos, assim como os personagens secundários, as refeições, os detalhes do quotidiano. Da Nova Inglaterra a Istambul, de Amesterdão aos Balcãs, de Oxford aos Pirinéus franceses, os personagens estão em constante movimento. E tudo isto numa Europa da guerra fria, em que as fronteiras eram bem mais difíceis de transpor.
O verdadeiro personagem central, em torno de quem toda a história gira, só aparece lá para a página 730. Tanto suspense acaba por se revelar um tanto fruste. Apesar de, nas poucas cenas em que aparece, ser repetidamente caracterizado como temível, assustador, pavoroso, pouco no seu comportamento parece justificar tanta repulsa. Drácula é neste livro um morto-vivo erudito, sobretudo apostado em ampliar a sua fabulosa biblioteca, com um interesse pouco saudável mas meramente teórico em tortura e assassínio em massa, que se limita a mordiscar uns tantos académicos, arquivistas e bibliotecários, depois de devidamente avisados que não devem dirigir a sua investigação para certas temáticas. Ao fim de tantas aventuras, o número de vítimas é francamente pouco impressionante.
Mas o facto é que este é um livro realmente viciante, envolvente, extensamente documentado (se as fontes são reais ou fictícias fica por saber) e um hino ao amor ao conhecimento e aos livros. Suponho que faça mais lembrar O nome da rosa que O código Da Vinci (mas como só li o primeiro, não o posso assegurar). Em todo o caso, um livro a não perder.

Sem comentários: