
Admito que tenho uma parcialidade por livros grandes. Não aprecio particularmente contos nem pequenas novelas, por mais que sejam diminutas jóias, esforços admiráveis de precisão e contenção, demonstrações de mestria no domínio das palavras e das figuras de estilo. Eu gosto mesmo é de histórias e quando uma história é envolvente e bem contada, então quanto maior melhor. Agora estas 1000 páginas serão talvez um exagero... Este livro é um exercício admirável que cruza o pastiche de um romance do século XIX com um pressuposto fantasista, com um labor de notas de rodapé evocativo dos livros académicos. É um livro sobre a prática da magia em Inglaterra nos alvores de oitocentos mas o que o torna tão fascinante não são os espectaculares feitos de feitiçaria, que são escassos, mas sim a imbricação deste elemento de irrealidade num contexto muito prosaico e realista: a vida quotidiana, as relações de classe e de género, as viagens, a nascente industrialização, as guerras napoleónicas, o governo de um país. E sobretudo, o que talvez apelou mais ao meu interesse, a magia é concebida muito à semelhança das disciplinas científicas emergentes na época: a passagem de uma actividade amadora a profissional, a importância dos veículos de disseminação escrita (os livros, as publicações periódicas), a controvérsia e a conflitualidade, a formação de "escolas" e correntes de pensamento, as academias e clubes, a tensão entre teoria e prática, as restrições ao acesso à profissão, a construção da imagem pública do "mágico louco".
Agora é certo que a narrativa se perde ligeiramente em episódios acessórios, na multiplicação de personagens pouco úteis e até no desperdício de figuras que parecem centrais mas que depois se limitam a uma aparição fugaz.
Mas é um óptimo entretenimento, em certos momentos humorístico, magistralmente bem escrito e garantia de umas dezenas de horas bem passadas. O que mais se pode pedir?
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