sábado, julho 28, 2007

Contos da modernidade avançada


Era uma vez um touro sagrado, chamado Shambo, que residia num templo hindu algures no Pais de Gales. O touro tinha duas vidas, uma como animal santo, objecto de adoração pelos monges e pelos fiéis, outro como bovino residente no Reino Unido, sujeito às leis do país. No início deste ano, as duas vidas do touro colidiram: em exames de rotina, realizados pela autoridade veterinária, detectou-se o bacilo da tuberculose. E foi aqui que as duas vidas da besta colidiram. A lei diz que os animais infectados têm de ser abatidos. A religião hindu afirma que a vida dos touros é sagrada, não pode ser terminada à força. As autoridades galesas ratificaram a sentença de morte. Os monges do templo tentaram jogar no campo do adversário: por meio de argumentos científicos (os testes realizados não são infalíveis, podem dar origem a falsos positivos, seria necessário efectuar mais análises) e jurídicos (o animal não tem fins pecuários, não está em contacto com outros animais, excluíndo a possibildiade de contágio) tentaram revogar a sentença nos tribunais.
Esta semana este caso teve o seu desfecho. Ganhou a lei e a autoridade terrena. Perante a resistência pacífica dos monges e dos activistas dos direitos dos animais que entretanto se tinham juntado à causa, que protelou por umas horas o inevitável, polícias e autoridades sanitárias forçaram a entrada no templo e levaram o bicho para abate. A autópsia confirmou a tuberculose. Os hindus crêem que fizeram o que estava ao seu alcance para adiar o ciclo de reencarnação da besta sagrada e que o karma se encarregará se punir os sacrílegos. É assim a modernidade avançada.

quinta-feira, julho 19, 2007

Os Museus da Politécnica merecem ser vistos



Contra ventos e marés, cascas de nozes no universo que é a Universidade de Lisboa, desterrados longe da Cidade Universitária, com orçamentos batalhados, os dois Museus da Politécnica não se têm saído nada mal. Muitas das exposições são feitas quase (quando não literalmente) à mão, artesanalmente, com a "prata da casa", muitas vezes em salas sem reboco.

Proporcionam uma tarde bem passada, entre as experiências da exposição participativa e o deslumbrante laboratório chimico do Museu de Ciência, os dioramas realistas e os animaizinhos em formol do Museu Bocage, os dinossauros e os pedregulhos do Museu Geológico, as árvores e as borboletas do Jardim Botânico.

E pode ser só uma observação casuística, mas parece que a um Sábado à tarde de Julho não havia assim tão poucos visitantes...

Borboletas e museus


Está em exibição no Museu Nacional de História Natural uma exposição que vale realmente a pena visitar. Não só o tema é apelativo, como está extraordinariamente bem conseguida. É exemplar de como se pode combinar conservação da natureza, divulgação científica e comercialização de merchandising. E como se pode falar de ciência sem tomar o público por ignorante e manipulável.
Abre com uma projecção de animação por computador da marcha que ilustra a perenidade das borboletas ao longo de milénios. O quadro final, relativo à actualidade, não podia ser mais desanimador. Prossegue com uma sala interactiva onde se apresentam as borboletas ibéricas ameaçadas de extinção. Destaca depois a investigação científica sobre borboletas: dá voz e corpo aos cientistas ilustres que as estudaram na Península Ibérica, mostra os procedimentos para capturar espécimes, exemplifica a sua classificação e estudo e até deixa ver o interior de um moderno laboratório de biologia molecular onde se faz investigação genética sobre estes seres alados. No final há fotografias e objectos que tomam as borboletas como mote. E um balcão para venda de traquitanas associadas.
Lá fora há uma estufa onde se encontram exemplares vivos. Mas isso ficou para outra visita.

sexta-feira, julho 13, 2007

Ficámos no Savoy



que é um hotel perfeitamente simpático. Fica a uma distância aceitável do centro do Funchal. Dá acesso às exóticas piscinas e ao mar a partir do Royal Savoy. Tem um pequeno almoço abundante e variado. Os quartos são enormes e as camas idem. Proporcionam aos hóspedes roupões de banho. Tem uma pequena biblioteca com romances em inglês (que salvou este pequeno dragão do tédio depois de já ter esgotado a leitura que levava de casa). Tem um jardim com jogos como badmington, mini-golf, ping-pong. Tem um salão de colunas que parece saído de um palacete. E exuda um charme decadente a que é difícil resistir: os veludos coçados, os dourados oxidados, os cristais baços, as carpetes puídas, as lajes de mármore quebradas. A idade média dos empregados ronda os 60 anos. Todos os anos nos dizem que está para ser implodido. Esperemos que não.
Mas ainda não perdi a esperança de um dia ficar no Reid's. Do outro lado do penhasco, parece ainda mais majestoso, apesar dos apendices modernos. Teve hóspedes famosos, como Wiston Churchill, e mantém um jardim frondoso. Talvez um dia...

E o que fizeram os dragões nas férias?






Nada de mais. Chapinharam em todas as piscinas do hotel, mergulharam no mar, leram romances deitados em espreguiçadeiras à sombra das palmeiras, caminharam pela cidade, passearam de catamarã para ver golfinhos, preguiçaram na esplanada do Golden Gate (a "esquina do mundo" segundo o Ferreira de Castro - mais sobre isto mais tarde), empaturraram-se de peixe e milho frito, bolo de mel e vinho madeira. Que mais se podia pedir?

Isto









levou-nos a comprar isto.


O snorkeling é uma experiência fascinante, mesmo sem viajar para lugares exóticos como Sharm-el-Sheik. Em ilhas de águas límpidas e cálidas, mesmo à beira da costa vêem-se peixes e estrelas do mar muito bonitos. E boiar à superfície dá a sensação de estar a sobrevoar um mundo diferente, aquoso, mágico.

Post dedicado

à d. Lúcia e à D. Raquel.

Os dragões estiveram na Madeira

Uma ilha brumosa no meio do Atlântico,


















cheia de vegetação luxuriante
















de picos escarpados,
















de casinhas espalhadas pelas encostas

















de ruas tranquilas onde se pode passear.


terça-feira, julho 03, 2007

Mistério















Não sei ao certo porquê, mas este dragão é viciado na série/documentário Miami Ink. Talvez esteja na natureza da reality tv o seu consumo se tornar aditivo. Mas à partida episódios de 40 minutos sobre a vida quotidiana numa loja de tatuagens não é suposto despertarem tanto interesse. Mas o certo é que o fazem. Talvez seja a minha tendência voyeuristica, talvez seja defeito profissional, talvez seja por haver poucas alternativas na programação habitual. Fascinam-me as tatuagens, as justificações que as pessoas mobilizam para se tatuar, as bizarras escolhas das imagens com que vão viver (talvez) até ao fim dos seus dias. É uma estranhamente bela forma de arte. E vê-se de tudo: dragões alados, carpas koi, caveiras flamejantes, retratos de entes queridos, animais de estimação, letras de alfabetos arcaicos, bichos exóticos, figuras religiosas, paisagens, objectos do dia a dia, declarações de amor eterno, motos de vida... E desengane-se quem pensa que os clientes são só motoqueiros barbudos. Aparecem raparigas bonitas, mãe de família, adolescentes atinados, pais extremosos, avozinhas... E muito mais que símbolos de identidade grupal, as tatuagens parecem ser mais um sintoma da obessão americana com a psicologização do eu: são feitas essencialmente para marcar ritos de passagem, perpetuar uma fase da vida, celebrar sucessos, fazer o luto por alguém, recompensar o sofrimento ou o esforço, reforçar laços afectivos... Um objecto de estudo fascinante.